Sempre dizemos, e é uma verdade absoluta, que os riscos estão presentes em todas as atividades humanas, sejam em casa, durante o lazer ou no trabalho. Devido às circunstâncias presentes nas atividades de trabalho, podem existir riscos acentuados e inaceitáveis. Essa definição, se aceitável ou inaceitável, muitas vezes, fica a critério do próprio trabalhador. Não é possível acompanhá-lo durante todo o tempo e, mesmo que as condições do local estejam adequadas, as atividades realizadas podem representar a maior probabilidade de ocorrência do acidente ou doença ocupacional. Isso posto, vamos a mais um caso ilustrativo de exposição ao risco e “mau” uso de proteção respiratória.
O caso relata o uso de respiradores em uma indústria de tubos de PVC, utilizados em obras de saneamento. Vários processos são executados nesse tipo de indústria, extrusão, enrolamento, revestimento, laboratório etc. Em diversas destas operações é necessário o uso de proteção respiratória. Os equipamentos utilizados são do tipo peça semifacial e facial inteira com filtros para gases ácidos e vapores orgânicos.
Em uma rápida visita às áreas de produção, vários desvios e mau uso de respiradores foram constatados. Por exemplo, em um pequeno almoxarifado de produtos químicos, havia uma máscara facial inteira, com filtros, pendurada em um gancho de parede. No local, havia uma placa de advertência com os seguintes dizeres: “AO ENTRAR NESTE LOCAL, USE A MÁSCARA.” Questionado, o técnico de segurança disse que aquela máscara estava ali exposta porque era de uso coletivo, ou seja, todos os trabalhadores que adentravam aquele local, deveriam utilizar aquela mesma peça facial.
Em um outro setor da fábrica, todos os trabalhadores utilizavam respiradores semifaciais com filtros para gases e vapores. Perguntado sobre o motivo de se utilizar aquele tipo específico de Equipamento de Proteção Respiratória (EPR), o técnico disse que naquele processo, utilizava-se uma substância química perigosa, trióxido de antimônio. Durante a operação, parte desse material era liberado no ambiente e, por isso, a necessidade de uso daquele tipo de EPR. Nesse mesmo setor, encontramos um trabalhador utilizando uma máscara descartável com filtro P1. O técnico disse que se tratava de um funcionário terceirizado responsável pela limpeza, varrição, do setor. O funcionário estava utilizando a máscara de forma incorreta, pois somente a tira elástica que passa por cima da cabeça estava presa. O tirante que passa por traz do pescoço estava solto. Segundo o próprio funcionário, ele sempre utilizava dessa forma porque o tirante do pescoço incomodava, “dava coceiras”, naquela região.
Após a visita, ficou evidente que a empresa não possui um Programa de Proteção Respiratória (PPR) implementado. Respiradores utilizados de forma incorreta, funcionários com barbas utilizando peças faciais e semifaciais que requerem vedação facial, falta de exame médico e ensaio de vedação, falta de limpeza, higienização e manutenção de respiradores etc.
Para finalizar, vale destacar um ponto muito importante nesse caso. O trióxido de antimônio é um produto químico altamente tóxico, quando inalado. Pode causar pneumoconiose, uma doença pulmonar silenciosa, irreversível, que pode provocar dificuldades respiratórias severas e a morte do trabalhador. O Limite de Exposição Ocupacional (LEO) desse agente é bem baixo, 0,02 mg/m3(I), notação A2 (suspeito carcinogênico humano). Ou seja, a probabilidade de desenvolver a pneumoconiose é alta quando a concentração do agente no ambiente de trabalho ultrapassa esse valor. A empresa não informou se foi feita alguma análise, nem qual foi a concentração encontrada. Há ainda que considerar que se o LEO está expresso em mg/m3(I), supõe-se que sua presença no ambiente deve se encontrar na forma de material particulado, e a preocupação do desenvolvimento da doença, pneumoconiose, está relacionada com a fração inalável(I) desses particulados. Os filtros para gases e vapores utilizados tanto na peça semifacial, como na peça facial inteira, não são apropriados para retenção de material particulado. Isso denota a falta de critérios para seleção de respiradores na empresa. Destaca-se ainda a falta de comunicação do risco a trabalhadores terceirizados, uma vez que esses utilizam equipamentos diferentes daqueles utilizados pela empresa, nos mesmos ambientes contaminados.
Um Programa de Proteção Respiratória (PPR) bem implementado deve conter: procedimentos para seleção e uso de respiradores, manutenção, limpeza, higienização e guarda de EPRs, exames médicos, ensaios de vedação facial, monitoramento de uso etc.
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Na próxima semana, publicaremos um sobre “Grau de Risco e Proteção Respiratória”, o qual pode ajudar na compreensão sobre como o respirador pode contribuir para diminuir o grau de risco na exposição a agentes químicos.